Carlos Moura, Presidente da AHRESP
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“No canal HORECA há uma preferência generalizada por produtos nacionais”
Alexandre Bastos é o segundo interveniente visitado pelo périplo de entrevistas aos presidentes dos grupos de setor da AHRESP. Num retrato da atualidade da Indústria e Comércio Alimentar e de Bebidas, aborda temáticas como a valorização da gastronomia nacional por via dos estabelecimentos HORECA, a importância da inovação e tecnologia, e as novas exigências dos consumidores.
Texto Luís Carlos Soares | Fotos Nuno Martinho
Portugal é um destino turístico em voga, com a gastronomia portuguesa a ser unanimemente apontada como um dos pilares deste recente aumento de popularidade. As empresas do grupo de setor da Indústria e Comércio Alimentar notam nos agentes do canal HORECA esta tendência de valorização da gastronomia nacional?
Sem dúvida. Nota-se esta tendência um pouco por toda a parte. Há um crescente interesse pela gastronomia portuguesa por parte de todos os players em geral, existem todos os dias novos conceitos de restauração inspirados na nossa gastronomia, refiro-me também ao notável trabalho das escolas hoteleiras um pouco por todo o País, que através dos nossos jovens e promissores talentos procuram criar novos pratos, novas imagens e até designs cada vez mais sofisticado desses pratos. Destaco também a inovação alicerçada na redescoberta de antigas e novas vocações para ancestrais ingredientes por parte dos nossos chefs. De uma forma intensa, está-se a também a reinterpretar o nosso imenso património gastronómico. O petisco, tão tipicamente português, está em alta e é muito apreciado pelo público nacional e internacional. Naturalmente que a procura por parte dos profissionais da restauração pela qualidade e por produtos diferentes é notada por todos os agentes económicos. Critérios baseados em elevados e exigentes padrões são cada vez mais reclamados pelos nossos profissionais da indústria hoteleira.
O crescente consumo dos portugueses e o aumento do número de turistas que nos visitam implicam novos desafios para este grupo de setor?
De facto, é assim. São os padrões de exigência da procura que determinam os desafios. Desafios que existem em toda a cadeia de abastecimento: não só nos produtos, mas também no serviço prestado, nos prazos de entrega, no ciclo de reabastecimento – que tende a ser mais rápido com entregas de menor quantidade e maior variedade. Além disso, o setor do Retalho trouxe para o grande púbico o conhecimento e o acesso a novos ingredientes todo o ano e até mesmo os sazonais, os programas de televisão temáticos ligados à gastronomia, a própria imagem renovada da profissão de Chef, criaram a convicção que não há limites para fazer mais e melhor.
A origem portuguesa de produtos alimentares e bebidas é um fator a que os empresários do canal HORECA dão primazia?
Sim e cada vez mais. Além do caso dos vinhos ou até mesmo o café, apenas se consomem produtos portugueses e chega a ser quase impossível encontrar cartas com vinhos estrangeiros, no canal HORECA há uma preferência generalizada por produtos nacionais que são os mais apropriados para a confeção do receituário nacional. Naturalmente que não sendo o País autossuficiente na área alimentar, há sempre o inevitável recurso a importações e a produtos estrangeiros. Mas o paladar tão marcantemente português está sempre lá, difícil ou até impossível de reproduzir de forma genuína por estrangeiros ou com matérias primas de origem internacional. A este propósito, veja-se a dificuldade a nossa diáspora tem em encontrar produtos nacionais nesse mundo para confecionar os nossos tradicionais paladares.
Ultrapassada a crise nacional e internacional que marcou a primeira metade da década, os estabelecimentos do canal HORECA passaram a privilegiar produtos de qualidade superior?
Eu diria que a qualidade sempre existiu nos produtos portugueses. O que aconteceu foi que a procura cresceu muito e a criatividade e a vontade de inovar também. O público em geral é também mais exigente, mais conhecedor, nomeadamente nos últimos anos, prefere qualidade e criatividade à quantidade. Tal favoreceu uma dinâmica positiva de exigência recíproca entre criadores, publico, indústria e comércio.
Os estabelecimentos do canal HORECA deparam-se com clientes cada vez mais informados e exigentes, com alguns nichos de consumidores (como os vegans, intolerantes à lactose ou celíacos) que procuram produtos muito específicos…
Sim, essa descrição representa os tempos atuais. Se quisermos comparar com o que se passava há uma ou duas décadas, constatamos que temos todos mais acesso a informação médica, preocupações com saúde e bem estar, atenção ao exercício físico, ao excesso de peso, promovemos hábitos de vida saudável, trocamos experiencias e receitas, participamos em fóruns, lemos blogs online, etc. Tal exigiu da indústria inovação e criatividade para responder a estes desafios, aos novos nichos de consumidores. Veja-se, a título de exemplo, a alimentação com recurso a suplementos alimentares tão utilizada por desportistas e outros públicos, que perceberam que a alimentação é também um combustível que deve ser doseado em função das nossas caraterísticas e objetivos a alcançar.
Esta diversidade de perfis de consumidores tem reflexo na atividade das empresas do setor que representa?
Para o setor é uma oportunidade e sabemos que tem sido bem aproveitada: daí o sucesso das fórmulas bio e, mais concretamente os alimentos biológicos, os vegan, os funcionais, dietéticos ou mesmo os produtos disruptivos. Falo também da reinvenção de produtos e da ampliação de gamas. A inovação e tecnologia são os motores da alimentação do futuro, levando em conta sempre a segurança alimentar e nutricional, mensagem que em minha opinião tem sido bem assimilada pelo setor.
Este ano tomou posse como presidente do “Grupo de Setor da Indústria e Comércio Alimentar e de Bebidas, e Emissores de Vales de Refeições”, até 2021. Quais são os principais desafios a que propõe para este novo triénio?
Será um triénio repleto de desafios que muito nos animam. Foram enumerados cinco grandes desafios para este Grupo de Setor (ver infografia), sendo que para cada um destes foram desenvolvidas linhas de atuação e métricas para aferirmos o nosso progresso na execução dos nossos objetivos de cada grande desafio. Além disso, o projeto Taste Portugal e a Rede de Portugueses no Mundo (RRPM) na sua vertente exportação, é também uma prioridade. Fazer chegar além-fronteiras o melhor do nosso País em termos alimentares é também um desafio muito estimulante.
Uma das principais preocupações atuais da AHRESP é a falta de mão de obra para operar nos setores que representa. O Grupo de Setor da Indústria e Comércio Alimentar também faz eco desta necessidade?
Sim, sem dúvida. O setor da Indústria e Comércio Alimentar poderá encontrar soluções para integrar ainda mais na origem o processamento e tratamento das matérias primas, para que nos espaços de restauração haja uma menor necessidade intensa de mão de obra. Há processos operativos locais que podem ser substituídos gradualmente por soluções com origem no setor, com vantagens claras para o ambiente e para o desperdício, visto que na indústria e comércio alimentar tudo deve ser normalizado e quantificado.
Como avalia a campanha “Menos Plástico, Mais Ambiente”, desenvolvida pela AHRESP ao longo deste ano, com o objetivo de sensibilizar os estabelecimentos do canal HORECA para a necessidade de alterar comportamentos na utilização de artigos de plástico?
É uma iniciativa notável e louvável da AHRESP, tenho acompanhado algumas das várias ações. A AHRESP tem cumprido muito bem o seu papel de agitador da consciência ambiental e os resultados estão já bem à vista. Considero que é também uma vocação desta associação o serviço que presta ao planeta e na defesa dos superiores interesses de todos nós. Não há atividade humana que não deixe a sua pegada, mas é nossa obrigação fazer melhor e contribuir para a sustentabilidade ambiental.
As empresas portuguesas da indústria e comércio alimentar estão sensíveis para as questões ambientais? De que forma o manifestam?
Cada vez mais. Não só através das candidaturas crescentes e à obtenção com mérito de processos de certificação ambiental, bem como na sua renovação, mas também na forma como comunicam estas preocupações aos seus consumidores, colaboradores e público em geral.
Os cinco grandes desafios do Grupo de Setor da Indústria e Comércio Alimentar, identificados por Alexandre Bastos:
– Aproximar o setor do Comércio e Indústria Alimentar aos associados AHRESP e aos stakeholders em geral;
– Afirmar o setor dos vales de refeição como uma vantagem para os associados AHRESP;
– Aumentar a oferta e apoio ao Canal HORECA, com base nas soluções do Comércio e Indústria;
– Contribuir para a promoção da alimentação saudável;
– Participar na preparação de códigos de boas práticas entre fornecedores e estabelecimentos.